Como psicóloga, você já deve ter ouvido que “ouvir” é diferente de “escutar”. E, de fato, são ações distintas, tanto na língua portuguesa quanto na prática clínica. Vamos explorar como esse entendimento é essencial para o nosso trabalho e como podemos desenvolver uma escuta mais refinada no setting terapêutico.
Ouvir é Escutar?
A diferença pode parecer sutil, mas é profunda. “Ouvir” está relacionado à capacidade física de captar sons. Já “escutar” exige atenção consciente e envolve uma conexão mais complexa. Na clínica, não basta ouvir o que o paciente diz — é preciso escutar o que está além das palavras, aquilo que ecoa e reverbera em nós.
O que é Escuta Clínica?
A Escuta Clínica, conceito introduzido por Freud, vai além de uma simples audição. Trata-se de um processo relacional e terapêutico, onde terapeuta e paciente constroem juntos novos significados. Como Dourado, Macêdo e Lima (2016) pontuam, essa escuta “não se caracteriza como uma escuta comum, mas como um ouvir diferenciado, que favorece novos modos de sentir, pensar e agir”.
Escuta e Transferência: um laço essencial
A transferência é outro conceito psicanalítico fundamental, e é ela que permite que o setting terapêutico se diferencie de uma conversa casual. Esse “plasma invisível” entre terapeuta e paciente é o que sustenta a relação e possibilita intervenções profundas. Para manter essa relação saudável, é indispensável que a terapeuta cuide de si mesma por meio de terapia pessoal e supervisão. Afinal, você é seu principal instrumento de trabalho.
Eco, reverberação e a Escuta
Uma boa escuta clínica acontece quando permitimos que as palavras do paciente reverberem em nós. Essa reverberação não diz respeito apenas aos fatos narrados, mas ao impacto subjetivo que essas narrativas causam. É esse impacto que nos ajuda a formular intervenções que realmente toquem o outro.
Dicas para desenvolver a Escuta Clínica
- Emprestar o corpo ao processo: esteja presente de forma íntegra e honesta no setting. Permita-se ser afetada, mas mantenha clareza sobre quem você é e sobre seus próprios limites.
- Esvaziar-se para escutar: lide com seus próprios “ruídos internos” em terapia e supervisão. Assim, você estará mais disponível para o paciente.
- Praticar o tripé: Teoria, Terapia e Supervisão — Esses pilares são a base para afinar sua escuta com o tempo e a prática.
- Valorizar a subjetividade: A subjetividade do paciente é tão única quanto uma teia de aranha — complexa e interligada. Sua escuta precisa supor essa singularidade, sem impor suas próprias lentes.
- A arte do origami como metáfora: assim como na construção de um origami, a escuta clínica é feita de dobras e redobras. A cada encontro, terapeuta e paciente criam algo único, marcado por caminhos que só pertencem àquela relação.
O desafio da Escuta Clínica
Por mais que possamos estudar sobre fases da vida e fenômenos humanos, como infância ou luto, nunca saberemos, de antemão, como cada sujeito responderá a essas condições. O papel da terapeuta é escutar o que o paciente tem a dizer, sempre com humildade e abertura. E, se você achar que está “entendendo” completamente o que ele está dizendo, cuidado — talvez seja o momento de reavaliar sua escuta.
Desenvolver a Escuta Clínica é um processo contínuo, mas essencial para o trabalho no setting. Como está sua escuta hoje? Reflita sobre isso e compartilhe suas experiências nos comentários! 😊