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Hoje em dia, educar filhos virou quase um projeto de engenharia. Pais e mães, bem-intencionados e cheios de medo, se agarram a modelos, teorias e estratégias na tentativa de garantir que seus filhos sejam felizes e não sofram. Como se fosse possível eliminar a dor da vida. Como se existisse um jeito certo de criar um filho “perfeito”.

A psicologia do desenvolvimento, do jeito que é amplamente difundida, reforça essa ideia ao tratar a criança como um ser em construção, um projeto inacabado. Se ela ainda está se desenvolvendo, então, em tese, podemos moldá-la para que atinja um resultado ótimo, certo? Errado. Essa lógica faz parecer que existe um caminho garantido para o sucesso, mas ignora algo fundamental: o humano é um ser atravessado por faltas, desencontros e imprevistos. E crescer envolve tudo isso.

Além disso, vivemos em um mundo que empurra a produtividade e a superação a qualquer custo. O medo de que os filhos “fiquem para trás” faz com que muitas famílias os submetam a um verdadeiro treinamento de alta performance desde pequenos. Tudo precisa ser estímulo, tudo precisa agregar valor. Mas será que é disso que as crianças precisam? Ou será que essa pressa em prepará-las para um futuro competitivo só as rouba do presente?

Tem também outro fator: a relação dos pais com suas próprias dores e expectativas. Muitas vezes, os filhos acabam carregando o peso de serem aquilo que os pais gostariam de ter sido – ou que acham que deveriam ter sido. O medo do fracasso, a necessidade de provar valor, a busca por reconhecimento… tudo isso, consciente ou inconscientemente, vai sendo colocado sobre os ombros das crianças. E quando elas não correspondem a esses ideais? A frustração aparece.

E talvez uma das angústias mais difíceis para os pais hoje seja justamente essa: perceber que não têm o controle total da experiência dos filhos. O sentimento de falha – seja na missão educativa, seja aos olhos dos próprios filhos – é insuportável para muitos. Por isso, a tentativa constante de acertar, de corrigir, de encontrar o “método infalível”.

Mas Lacan já nos alertava: não existe modelo de família ou de educação que possa suprimir a angústia que habita a experiência humana. Não dá para blindar os filhos do sofrimento. E tudo bem. A vida não é sobre evitar a dor a qualquer custo, mas sobre aprender a atravessá-la. O que os filhos realmente precisam não é de um projeto de perfeição, mas de pais que saibam ser humanos.

Val Ribeiro

Psicóloga Clínica especialista em Psicanálise e Saúde Mental pela UERJ; Especialista em Atendimento Clínico Psicanalítico pela UFRGS; Mestre em Psicologia UFU. Val, como ela gosta de ser chamada, é vice-presidente do Instituto Janeiro Branco, e vem trilhando seu caminho acreditando na potência do ser humano e na criação de uma cultura da Saúde Mental nas sociedades como formas de revolucionar o mundo e as experiências de desenvolvimento humano.

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